DIÁRIO DE BORDO
28 may 2017 – Dia 0
Chegou o momento para o qual nos preparamos tanto. Aproximadamente as 11hrs iniciamos a travessia do oceano Pacífico. Estamos saindo de Perlas, juntamente com o veleiro Huaiqui, com destino as Marquesas, na Polinésia Francesa. Alguns dias antes de iniciarmos a travessia recebemos uma maravilhosa notícia, tripulação aumentou para 3. A Vivi está grávida. O peso nas costas aumentou, mas vamos nessa. Depois de toda a preparação e expectativa criada durante os 5 anos desde que começamos a trabalhar no projeto, eu esperava que fosse estar nervoso com essa travessia em específico, que é a mais longa. A sensação,por enquanto ,é de inicio de uma navegada como outra qualquer. Acho que é influencia do dia, o sol esta brilhando e o mar plano. Tudo certo. Aqui vamos nós.
O barco está bem provisionado. Além de toda a comida que, com exceção da comida fresca, calculamos ser suficiente para nos alimentar pelos próximos 6 meses no pacífico. Estamos levando 340 L de agua nos tanques, 210 L de agua potável em garrafas, 110 L de diesel no tanque e 168 L de diesel em galões. Para quem quiser acompanhar mais de perto os dados de consumo e assim como os dados técnicos da navegação, segue em anexo um arquivo excel com os detalhes.
29may17 – Dia 1
Muita chuva desde o amanhecer. Foi gostoso tomar banho de chuva. Depois de muito tempo de calor intenso no Panamá, deu até para sentir um friozinho. A observação dos animais tem sido fantástica. Passando pelo extremo sul do arquipélago de perlas, os golfinhos vieram fazer a escolta. Logo depois um Marlin resolveu se aparecer, cruzou a proa do Carapitanga saltitando. Na primeira noite assustei quando vi pela primeira vez os golfinhos voltarem a se aproximar, mas agora envoltos pelos plánctons luminosos. Show pirotécnico, inesquecível. Hoje um tubarão de tamanho respeitável se aproximou para fazer um reconhecimento. Era bem gordo, escuro em cima e rajado por baixo, acho que era um bull shark.
01jun17 – Dia 4
Dois dias sem escrever e um sem acompanhar a navegação. Foi por desânimo. Desde a noite do dia 30/jun enfrentamos uma correnteza contra muito significativa (chuto 2 a 3 nós) que só a partir de ontem a tarde começou a enfraquecer. Neste momento ainda navegamos com corrente contra. Portanto, não preciso dizer que avançamos muito pouco. Além disso, também na noite do dia 30 começou a cair o mundo em agua e só foi parar na tarde do dia seguinte. Mas enfim, nada como um dia após o outro. Hoje o dia esta lindo e navegamos a vela desde bem cedo até depois do almoço. Pouco a pouco vamos nos aproximando da região onde ventos mais favoráveis predominam. Hoje tive que mergulhar, tivemos o azar de nos enroscar em uma rede de pesca estando a mais de 100 nm da costa. Parece que essa região a pesca é intensa, pois os amigos do veleiro Huaiqui também se enroscaram. Bem é isso, o astral da tripulação vai melhorando a medida que vamos conseguindo nos livrar do golfo do Panamá.
02jun17 – 23:30 hrs – Dia 5
A Vivi anda vomitando bastante, espero que ela melhore logo. Hoje ela tomou remédio para enjoo. Ainda sigo com a cabeça ocupada em chegar logo em uma area de ventos mais favoráveis e, portanto, navegar mais a vela e diminuir o número de manobras necessárias. As manobras não tem sido poucas. Por exemplo, hoje amanhecemos o dia com motor e fazendo rumo de 230 graus. Depois do cafe passamos ao baile da retranca. O baile é decorrente da variação do vento, que teima em mudar de direção para quase sempre vir de frente. Antes do almoço o vento se decidiu e subiu de intensidade, apagamos o motor e fizemos rumo de 270 graus a 4 nós, aproximadamente. No meio da tarde o vento foi virando em sentido horário e tivemos que dar um bordo para evitar perder os graus de latitude suadamente ganhos na direção sul. Navegamos com rumo 160 graus até o inicio da noite, quando o vento caiu bastante de intensidade. Agora vamos navegando a motor com rumo 230 graus. Amanha tem mais manobras, certamente. Mas, é aliviante pensar que ja estamos quase lá, faltam poucos graus para entrarmos em uma zona mais confortável.
04jun17 – Dia 7
Doce ilusão. Mais confortável? Ai que saudade do baile da retranca, onde o vento variava de direção e intensidade nos deixando oportunidades de ir para sul. La estão os ventos de S e SE que queremos, bastante mais favoráveis. Desde ontem bem cedo estamos negociando com um vento SO de 15 nós. Estamos orçando o máximo que podemos para tentar navegar para Oeste. Orçar contra os alísios é como a luta do rochedo contra o mar. Só que neste caso, como o mar se mostra muito sólido!
Para não ficarmos estupidamente adernados, baixamos bastante os panos. Ou seja, vamos devagar. Nossa situação, portanto, exige paciência. Em algum momento a coisa vira…
É bom para aprender que a situação presente não é ruim ou boa, ela apenas exige que saibamos aproveitar o seu melhor lado, ao invés de ficarmos chorando as pitangas em função das desvantagens dela. É isso ai, seguimos. A verdade é que tudo vai bem, tudo funcionando!
07jun17 – 15:00 hrs – Dia 10
Vira, claro que vira, mas demora. Muito vento nos últimos dias, principalmente durante a noite quando o vento tem chegado aos 20 nós. Os dias tem sido assim, inclinados e chacoalhados. O vento forte fez o mar subir bastante e ficar bem desencontrado. Mas, estranhamente, agora, as 15 hrs, as ondas praticamente sumiram e o vento continua soprando forte, meio estranho. No geral a coisa vai melhorando lentamente. A cada dia estamos conseguindo folgar um pouco mais a orça. Ontem fizemos uma descoberta não muito agradável. Perdemos a metade de um dos 3 tanques de agua, aproximadamente 70 litros. Aparentemente a fuga foi causada por uma braçadeira mal apertada, que se revelou problemática nesta condição de orça forte. Bola pra frente, vamos la, parece que o pior esta ficando para trás. Agora é hora da pipoca e cinema.
08jun17 – 12:30 – Dia 11
Finalmente o sol apareceu novamente. Acho que foram 3 dias quase que completamente nublados, o sol só aparecia por volta da hora do almoço. O barômetro também traz boas noticias, subiu. Espero que esses sejam sinais de que o mar vai se tranquilizar em breve. Estamos feito roupa em maquina de lavar desde o dia 03 de junho, se não me engano.
10jun17 – 13:30 – Dia 13
A noite passada foi ótima para descansar. O vento apagou ontem pela tarde, consequentemente, motoramos a noite toda com um mar calmo. Bem que merecíamos este descanso. Está tão bom que nem estamos incomodados com o fato de avançarmos muito lentamente nestas condições. Desde o ultimo dia que escrevi, o tempo vem melhorando e o vento baixando de intensidade. Os dias tem sido muito bonitos e as noites também, lua cheia. Ontem no pôr do sol apareceram nuvens de tempestade na alheta de boreste. Isso me faz desconfiar que os ventos e mares dos dias anteriores eram decorrentes de alguma tempestade mais ao norte. Tudo bem a bordo. Ontem foi dia de faxina, a Vivi deu uma bela organizada no interior do barco, e eu organizei o deck. O mar havia feito uma bela bagunça no deck. Alguns galões de diesel vazios se soltaram e ficaram sambando, apenas presos aos cabinhos que os amarravam. O dinghy ja estava quase soltando também. Nao é de se estranhar, pois não foram poucas as ondas que o castigaram. Aproveitei para reabastecer o tanque de diesel. Também dei uma boa organizada no cockpit. Enfim, estamos indo bem e agora mais animados com o barco mais organizado e os dias mais ensolarados.
12jun17 – 12:30 – Dia 15
As noites tem sido lindas, lua cheia e céu estrelado. É curioso como ver o cruzeiro do sul traz a sensação de estar em território conhecido. Estes últimos 2 dias tem sido restauradores. Durante o dia navegamos com vento leve e pela noite motor. O conforto a bordo melhorou bastante, os músculos fadigados agradecem. Uma sensação de paz vem tomando conta. Hoje, pouco antes do meio dia, avistamos uma embarcação e, logo depois, dois barcos de apoio. Deve ser gente que vem longe pescar.
14jun17 – 14:00 – Dia 17
É bastante aconselhável descansar enquanto se pode. Ontem no fim de tarde o sossego sumiu de uma forma inesperada, pelo menos para mim. Quando o sol se pôs, apareceu algo estranho no horizonte. Dava a impressão de que estávamos navegando em direção a uma cidade bem iluminada. Realmente, era uma cidade iluminada, flutuante e pertencente à Republica Socialista da China. Calculo que, no total, eram algo em torno de 100 barcos, mais ou menos equidistantes entre si. Durante a noite eu não soube muito bem do que se tratava. Haviam tantos holofotes em cada barco que dava a impressão de não se tratar de barcos, mas sim de espécies de plataformas iluminadas. Depois deu para perceber que as plataformas iluminadas se “mutavam” e saiam navegando como se fossem um cargueiro normal e corrente. Bem, não consegui piscar os olhos durante a noite, pois tive que fazer manobra atrás de manobrar para não se aproximar muito das “coisas”.
Só quando amanheceu é deu para ter certeza do que tratava, eram barcos pesqueiros Chineses. Em função das informações do AIS é que deu para chegar a esta conclusão, pois além dos nomes das embarcações, em alguns dos casos também a informação da nacionalidade do barco estava disponível. Navegamos através da “cidade” chinesa durante toda a noite de ontem e a manhã de hoje. Isso da uma ideia da imensidão da coisa. Somente agora, as 14:00, parece que vamos nos despedindo da chinatown, embora ainda se possa avistar alguns deles por ai. É assustador pensar na quantidade de peixes que esses caras devem estar matando. Enfim, por isso eu não esperava, pelo menos aqui no meio do pacifico sul.
E para não dizer que somos santos nessa história toda, também acabamos contribuindo para a matança. Pegamos um dourado. Teve sashimi, ceviche e moqueca!
16jun17 – 15:00 – Dia 19
Tudo vai bem, com exceção da Vivi que continua vomitando bastante, principalmente a noite. A propósito, ontem a noite ainda avistamos luzes no traves de BE, resquícios da Chinatown, provavelmente. Desde ontem ja estamos navegando com duas velas na proa, abertas uma para cada lado. Com essa configuração me da a impressão que e o barco sofre menos esforços. Com isso, me sinto mais confortável em deixar barco mais veloz. Mas nunca esqueço de uma frase que escutei de um casal de navegantes na Guiana Francesa. “Se quer ir longe, vá devagar”.
Terminei de ler mais um livro. Esse ultimo foi a biografia de Albert Einstein escrita por Walter Isaacson. O seu Alberto não foi moleza, um brilhante revolucionário!
20jun17 – 09:00 – Dia 23
Nestes últimos dias as ondas cresceram bastante e têm causado desconforto. O mar de fundo (São ondas formadas por ventos fortes em algum lugar distante. Geralmente são grandes e espaçadas), que insiste em vir de través, deve ter agora uns 3 metros de altura. Mas o que causa desconforto é o desencontro dos diferentes tipos ondas. Além do mar de fundo, temos outras 2 ondas. Uma é oriunda do vento local, que geralmente tem período bem curto e chega pela alheta de bombordo. E a outra onda se forma com a correnteza e chega pela popa. Usando as duas velas na proa diminui nossa estabilidade ao balanço lateral, ou seja qualquer onda aguda que chega pelo través ou pela alheta causa incômodo. As piores são as ondas de vento, que além de serem agudas tem período curto, ou seja, são bem pouco espaçadas entre elas. A Vivi está melhorando após ter tido, enxaqueca por 2 dias. Parece que a causa estava relacionada ao fato de ter voltado a comer glúten. Ontem tive dor de cabeça forte, preciso descobrir se vem da alimentação, falta dela ou se é minha rinite.
22jun17 – Dia 25
Parece que a minha dor de cabeça era causada pela rinite. Coloquei o desumidificador para funcionar nos últimos dois dias e a dor se foi. A Vivi também não teve mais dores. Tudo muito tranquilo a bordo desde ontem. O mar baixou consideravelmente e parece mais alinhado. Acredito que daqui para frente a tendência seja de as ondas de ventos locais e as ondas de correnteza se alinhem cada vez mais, a medida que vamos mais para oeste. Com relação ao mar de fundo, a tendência é também baixar pois, segundo o pilot chart, estamos nos afastando da zona de ondas grandes.
Antes de ontem no fim de tarde aconteceu uma coisa maravilhosa. Um grupo enorme de baleias e golfinhos navegaram com o Carapitanga por mais de meia hora. As baleias não eram muito grandes, as maiores deviam ter uns 4 m de comprimento, e suas cabeças pareciam bulbos de navios cargueiros. Fantástico.
Embora tudo esteja indo muito bem é inevitável sentir algum tipo de medo. No começo da viagem meus medos maiores estavam relacionados com os esforços do barco. Temia que algo se quebrasse. Agora que e a navegação esta bastante menos exigente para o barco fico com receio de bater em algo, uma baleia dorminhoca talvez. É interessante como o fato de estar muito longe de tudo mexe com a cabeça. Quando estou navegando sempre tento encontrar soluções para aqueles problemas que, segundo os meus critérios, tenham algum potencial de acontecer naquelas condições. No caso desta navegação, quando penso na possibilidade de quebrar o mastro ou ter um dano serio no casco, acho que até pode ter solução. Entretanto, certamente correríamos sérios riscos. Não achar soluções que possibilitem contornar as dificuldades com baixo risco me deixa incomodado. Acho que dai vem o medo.
23jun17 – Dia 26
O falado e sonhado conforto ainda não deu as caras. Durante a noite tem chovido. Ontem experimentamos o luxo, tomamos banho molhado completo. Existem três categorias de banho estipuladas para esta nossa travessia: lavagem a seco (lenço umedecido); meio aliche meio mussarela (molhado nas partes mais demandadas e o restante a seco); e banho molhado completo (luxo total).
29jun17 – Dia 32
Finalmente, desde uns 3 dias atrás, temos um pouco mais de conforto. As ondas definitivamente diminuíram e estão menos desencontradas. Agora temos uma rotina bem estabelecida a bordo. Quando acordamos a Vivi prepara o café da manhã. Eu, muito preguiçosamente, vou saindo do ninho do Mafagafo. Este foi o apelido carinhosamente dado ao camarote de popa. A inspiração veio do aroma atual do recinto. Depois do café dou uma checada na navegação e, eventualmente, faço algum ajuste de velas ou no piloto de vento. Depois vou para a sala ler. A Vivi também lê nesse horário, no ninho do Mafagafo. Depois do almoço a gente lê mais um pouco e tira um cochilo. Depois é hora do cinema, geralmente são 3 filmes por dia. Depois do cinema já é hora de escolher uma das modalidades de banho e depois ir para a cama. Eu, geralmente, acordo bastante durante a noite para checar a navegação e fazer ajustes. A Vivi também acorda, mas no caso dela, infelizmente, é para vomitar. E assim vão se passando os dias. De vez em quando, entre uma coisa e outra, jogamos gamão.
30jun17 – 23:30 – Dia 33
Como diriam nossos amigos do veleiro “Dutty Free”, basta falar na coisa para que em seguida aconteça tudo ao contrário. Pois bem, ontem e hoje tivemos bastante mar decorrente do vento local que subiu consideravelmente. Pensou que iria ser fácil, negão? Nesta última noite tivemos bastante chuva e, consequentemente, bastante rajadas fortes. Hoje promete também, pois a humidade segue alta e havia bastante nuvens densas no fim de tarde. Vamos ver como será a noite…
Contudo, não da para reclamar, tudo bem até agora. Faltam 4 dias ou menos.
01jun17 – 13:00 – Dia 34
Exatamente como foi previsto! Não caiu uma gota de agua durante a noite. Ou seja, não tem erro, basta falar algo para acontecer tudo o contrário. Eureca! Está aí descoberta uma nova força da natureza, acho que era essa a força que faltava para conseguirmos unificar as teorias da física que regem nosso universo. Mas acho que esta nova força não tem nada a ver com a física quântica, pois não se encaixa no principio da incerteza (é batata, não tem erro). A nova força pode ser definida da seguinte forma, basta estabelecer e divulgar certo comportamento esperado para que surja em seguida uma força de mesma direção e intensidade, porém de sentido oposto a tal comportamento previsto. O novo teorema ja foi testado e comprovado no mundo náutico. Fica aqui a sugestão para a realização de pesquisas em outros campos, para assim validarmos o teorema.
Acho que tenho que parar um pouco com as literaturas científicas! Já estou ficando meio pirado. A propósito gostei do livro “Uma breve história do tempo” de Steve Hawking, bem fácil e esclarecedor.
04jul17 – 03:30 – Dia 37 (Ultimo dia)
Não estou conseguindo dormir, não paro de pensar na chegada. Estamos a 40 nm do nosso destino, baía das virgens em Fatu Hiva, Polinésia Francesa. Não posso nem acreditar!!!
Não sei se vamos ter motor para a chegada. A ultima vez que usamos o motor por horas seguidas foi o dia que entramos na Chinatown. Naquele dia o motor deu umas pipocadas. Desde lá, usamos poucas horas. Ontem eu liguei o motor e ele morreu sozinho. Em seguida voltei a ligar e funcionou. Aparentemente, o problema é sujeira no diesel. Bem veremos…
Os dois dias anteriores ao dia de ontem foram maravilhosos, vento na medida, mar quase reto e céu limpo. As cores no por do sol vão ficar na memória. Entretanto, ontem a coisa foi bem diferente. O dia amanheceu chuvoso e sem vento. Em seguida vieram os Pirajás (chuvas fortes e concentradas que trazem ventos fortes localmente). Chegaram com vontade, estavam por toda parte. Por volta das 09 hrs, hora local, o Pirajá rei nos acertou em cheio. Não nos largou até depois do almoço. Navegávamos com um rizo na maior e a genoa com o tamanho de uma toalha. Ainda assim tive que mudar o rumo e colocar a popa para o vento para aliviar. Apos a chuva o vento apagou para em seguida subir consideravelmente. Desde então estamos navegando com aproximadamente 20 nós vindos de través. Agora estamos com a maior no segundo rizo e a genoa novamente com o tamanho de uma toalha. Estamos navegando a 6 nós. Estamos quase lá. Estou ansioso para saber como será chegar após 37 dias na imensidão do mar!
05jun17 – 14:10 – Dia 37 (A chegada)
Ancoramos aproximadamente as 9 hrs da manhã, hora local, do dia 04 de julho de 2017, com emoção. A aproximação à ilha foi linda. Quando os primeiros raios de sol entraram pela atmosfera deu para ver a sua silhueta, incrivelmente exuberante. Picos de montanhas altos e afilados. A medida que o sol ia trazendo mais luz para a cena, mais beleza foi aparecendo! Agora, alem da forma, havia uma explosão de cores, o verde vivo da vegetação, o negro e o ferrugem das rochas vulcânicas, tudo com um tom avermelhado característicos do nascer do sol. Estávamos envoltos por esta magia, já viajando em pensamentos sobre aquele lugar e tentando, em vão, fazer fotos e videos que pudessem retratar o momento, quando o presente invadiu a cena nos trazendo de volta para a realidade.
Era o motor, clamando pelo o seu papel naquela cena. Quando contornamos o estremo norte da ilha e, como era de se esperar, o vento apagou, tivemos que ligar motor. Ele funcionou por 5 minutos e depois começou a falhar e morreu. Depois de navegar 4000 milhas estávamos ali, a 5 milhas da ancoragem, boiando. Vez por outra desciam rajadas das montanhas vindas justamente da direção da ancoragem. Até poderíamos ter tentado chegar perto da ancoragem à vela, orçando no máximo e dando infinitos bordos. Mas neste caso a peleja não seria pouca. Além disso seria perigoso, a baía é pequena e a ancoragem já estava quase lotada. Resolvi tentar ressuscitar o motor. Primeiro, para eliminar esta possibilidade, tentei tirar algum ar que eventualmente pudesse ter entrado na linha que conduz o diesel até a camera de combustão. Nada, o motor funcionava para em seguida engasgar e morrer. Minhas suspeitas de obstrução da linha aumentaram, por algum motivo o combustível não estava chegando ao motor. Depois de umas 2 horas a gambiarra salvadora ficou pronta.
Desconectei o tanque de combustível e alimentei o motor diretamente com um galão de diesel. Bingo. A vida é bela, problema resolvido e vamos rumo ao paraíso. Que maravilha!!! Navegamos no contravento por uns 40 minutos, eu no cockpit e a Vivi la embaixo segurando o galão de diesel para evitar um acidente. Digamos que “maravilha” talvez não fosse a melhor palavra para o momento… Mas a situação parecia estar, no mínimo, contornada. Só que não. Não entendi nada quando a Vivi fez uma cara estranha e me falou que o diesel do galão estava acabando. Achei que ela estava delirando, só podia ser. Nosso consumo normal de diesel é de aproximadamente 1,5 l/h. Como gastamos 20 litros em 40 minutos? E para onde este diesel todo estava indo? Não deu tempo de pensar muito no assunto, alguns segundos depois o diesel acabou.
Boiando de novo, agora a 1 nm da ancoragem. A Vivi em seguida se propôs a ir enchendo o galão de diesel com o restante de diesel que ficou no tanque. E assim seguimos em direção a ancoragem, com a Vivi, a toda velocidade, alimentando o galão com uma caneca para evitar que o galao secasse novamente. Foi assim que chegamos na ancoragem, com o Carapitanga movido por 21 cavalos e 1 grávida. Foi maravilhoso entrar naquela baía deslumbrante. Mas não deu nem tempo nem para cumprimentar apropriadamente os nossos amigos do veleiro Huaqui, que já se encontravam fundeados há alguns dias. O diesel era consumido a uma velocidade absurda. Não havia muito tempo. Rapidamente a Vivi pegou o leme e eu fui preparar a ancora. Era preciso descê-la antes que o diesel acabasse e a gente fosse jogado para cima de algum outro barco pelas rajadas, que desciam ferozmente a montanha. Ufa, pronto, chegamos!
Passamos o dia todo em transe. Não parecia verdade que havíamos chegado e, muito menos, que um lugar tão bonito quanto esta baía pudesse existir. Depois de limpar, organizar um pouco o barco e arrumar o problema do motor*, no fim de tarde desembarcamos para ver se aquilo era mesmo verdade ou se se tratava de uma projeção de cinema. Sim, é solido, é de verdade. Ainda para completar o deslumbre fomos agraciados com um ensaio do grupo de dança Polinésia da ilha. Simplesmente maravilhoso. Acho que, segundo meus padrões atuais de riqueza, este deve ser uns dos povos mais ricos do mundo.
*Era sujeira na mangueira que traz o diesel do tanque. E o consumo exagerado do combustível do galão era porque o retorno desviava a grande maioria do diesel para o tanque. Eu não tinha ideia que o retorno de combustível para o tanque tivesse uma vazão tao grande.
OBS: Os horários mencionados acima se tratam de hora Panamá, com exceção dos casos onde se indica se tratar de hora local.
















Meus queridos carapitnga… agora sao as 09:00 e acabonde sair do mar depois de um belo banho entretido tentando passar a rebentaçao as duras penas para conseguir pegar uma ondinha. Entrei no mar antes do sol nascer e sozinho… coisa que sempre me deu muito medo… desafio superado😄😄cada um em seu desafio parabens pela travesia. Valeu por compartir incriveis e motivadoras experiencias..
CurtirCurtir
Boa seu Riscado, é isso ai. Esta tudo na nossa cabeça.
É muito gratificante receber esta mensagem.
Um grande abraço.
CurtirCurtir
Capitán , me descubro ante vosotros por la hazaña realizada
Os sigo con cariño admiración y muchísima envidia sana que me sirve para soñar y para desearos los mejores vientos y los mejores encuentros
Mi enhorabuena por el aumento de la familia ,será un ser especial protegido por Poseidón desde el principio
Espero veros algún día si recaláis por España y compartir algunas millas
Un gran abrazo y mucha suerte
Pablo González
CurtirCurtir
Muito legal a travessia e o relato foi emocionante e encorajador!!!! Não nos conhecemos pessoalmente mas acompanhamos vocês há algum tempo. Parabéns aos três.
Abraços,
Andréa e Rafael
SV SEA SOUL
CurtirCurtir
Oi Andréa e Rafael, boa tarde desde as Marquesas.
Esperamos encontrar voces em algum porto por ai.
Um grande abraço,
Felipe e Vivi
CurtirCurtir
Fala Capitão, muito legal o post sobre a travessia, aliás todos os posts ficaram ótimos. Estou pegando coragem p/ começar o meu projeto em breve aqui nos EUA. Vocês têm sido uma forte inspiracão. Um grande abraço aos 3 tripulantes.
CurtirCurtir
Fala Renato, boa! É isso ai, tem que por a vela em cima e seguir adiante!
CurtirCurtir
Queridos, simplesmente incrível ler os relatos desta travessia!
De alguma maneira, viajamos com vocês!
Espero revê-los em breve em alguma coordenada deste globo.
CurtirCurtir
Temos que agendar a próxima visita ao Carapitanga!
CurtirCurtir
Parabéns Amigos! Emocionante o relato de vcs.. e muito bacana ver vocês alcançando meta tão sonhada! Esperamos poder cruzar com vcs por alguma ancoragem paradisíaca por ai… Grande abraco, e parabens tb pelo peq velejador(a) que esta por vir.
CurtirCurtir
Certamente nos veremos por ai. O mundo é bem pequeno. Por onde navegam agora?
CurtirCurtir
Parabens pela nova tripulação!
Parabens pela mais longa travessia. Agora o resto é baba!
Nao recebo mais suas posições! Estava plotando no face mas parou. Varios perguntaram aflitos.
Excelente relato! Pude ir revivendo nossa propria travessia! Baleias Piloto, muito peixe para comer, o marlim passando na proa, os squalls, o estado do barco na chegada, e muito mais.
Ja tinha diagnosticado quem estava roubando o diesel do galão (kkk).
Lembranças para a Marrie Christine e o Teclo! Ela era a chefe e ele faz os tambores… se tiver um cabo verde, veio do Matajusi!
Lembrou dos pitus na cachoeira? Poe um pano no fundo, masca coco e cospe em cima… enche!
Abraço e bons ventos.
CurtirCurtir
Oi Silvio, saudações desde Taiohae.
Pois é, nao sabíamos que o SPOT nao tinha cobertura em boa parte do pacífico.
Muito Pitu atrevido nos rios por aqui. Adoram beliscar o pé.
Obrigado a tripulação do Matajusi por ter nos ajudado tanto a realizar nossa viagem!!!
Um grande abraço,
Felipe
CurtirCurtir
Felipe e Viviane, muito bom poder acompanhar vocês e também viajar na imaginação. Que Deus esteja sempre com vocês, protegendo e abençoando, principalmente a Vivi que carrega um(a) marinheiro(a).
E.T – muito boa a explicação das classes de banho. Kkkk
Abraços
Anderson
CurtirCurtir
Oi Anderson, ficamos felizes em saber que tem gente nos acompanhando e, de certa forma, viajando conosco.
Um grande abraço,
Felipe
CurtirCurtir
Uauuuu que maravilha capitão.
Adorei ler seus textos, tem que escrever mais…
Ri um bocado aqui.
Que paraiso para recepcionar vcs hein!?
Curtam, curtam muito…
Beijos na Familia Carapitaga
CurtirCurtir
Oi Elaine,
Sim, como diria o pessoal da minha família, é melhor rir para nao chorar. 🙂
O lugar é simplesmente fantástico.
Beijao,
Felipe e Vivi
CurtirCurtir